segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Ipês

Quem já viu um ipê em flor?
Todos, com certeza!
Roxo ou rosa, branco e amarelo!
No período da floração, perdem todas as folhas, e dão lugar as flores. Uma peculiaridade desta linda árvore.
A sua madeira é muito valorizada por sua resistência, dureza e flexibilidade, considerada assim uma madeira-de-lei.
Uma árvore que tem em sua flor o símbolo nacional.
Porém, essas coisas só conheço agora. Porque para mim existiam as árvores de flores amarelas antes de Rubem Alves, e agora existem os ipês depois de Rubem Alves.

Primeiro conheci suas poesias, seus pensamentos, depois conheci o poeta - mesmo não o tendo visto nunca - e por último as belezas que ele amava.

E assim as amei também.
Porque se ama tanto um autor, um pintor, um artista, um poeta?
Tenho aprendido que é porque eles falam o que nosso coração quer ouvir, não o que não sabíamos, mas o que tínhamos esquecido. Eles nos falam da nossa saudade. Nos falam da nossa beleza.
Uma beleza universal. Uma beleza que está gravada em nós como um estigma cuja cicatriz simboliza a lembrança.

Com Rubem aprendi que a leitura é um comungar de pensamentos, e o meu comungou muito com o dele. Ou o dele com o meu. Porque é a fusão de tudo que nós somos, não se sabe onde começa e onde termina. Porque lendo-o leio a mim mesma.

Lembro-me de uma frase de Clarice: "Quem és tu que me lês? És o meu segredo ou sou eu o teu?"
Os jardineiros passeiam pelos mesmos jardins. E se reconhecem.
Então todos os dias eu ando com Clarice, Cecília, Guimarães, Cora,Érico, Ana, Adélia, Fernando...
E comungo de seus pensamentos, de suas belezas, e me lembro de quem eu sou.
Hoje, todos os ipês me são Rubem Alves.
Mas me dei um em especial, pequenino ainda, mas que crescerá, ficará forte, perderá todas as suas folhas e florescerá, me recordando que nada acaba, tudo se transforma.
Antes eram apenas flores amarelas, hoje são ipês que me recordam a beleza de que todos nós somos feitos.

 "Vês lá longe os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo é inútil para mim. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então, será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo que é dourado fará lembra-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo."
Antoine de Saint-Exupery




segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Atrás das cortinas!

Um palco.
Quente, em suas madeiras. Vivo, sangue e veias.
Nele, desfilam vidas em pequenas histórias inventadas, sob luzes e escuridão.
Personagens.
Construção: trabalho e suor, alegrias e choros.
E o espetáculo se enche de calor, e é perfeito, real, todos acreditam nele.
"Que original!"
"Que verdadeiro!"
"Único!"
É mágico.
Mas na cartola, um truque.
Na magia, um ilusão.
No teatro, a máscara.
O embuste, as cortinas.
Pesadas, escuras.
Faz parte do show que sejam assim.
Escorre a tinta vermelha na tela que se protege sob a pele do ator.
Não existe maquiagem, figurino, interpretação.
Ali é a alma, nua e crua.
Às vezes nem tão bela, as vezes difícil de engolir.
Ali é onde a essência se manifesta. Onde o humano toca o céu e o inferno.
O espelho se reflete nitidamente, não há névoas, não há fuga, porque não há para onde fugir.
Só a dor da realidade, daquilo que é.
A criatura vira bicho ou num lampejo de grito, renuncia suas correntes e se cria.
Esquece o barro de que era feita, se reinventa, se modela.
Se reeduca, se ama.
Sofre, perdoa, esquece.
Vence! Perde!
O espetáculo se dá na coxia, nos bastidores de nós, onde não há luzes, nem olhares, nem aplausos.
Estamos sós, lutamos sós, vencemos ou perdemos sós, sem reconhecimento ou crítica de ninguém, somos atores, personagens, público.
Vida única atrás das cortinas!